terça-feira, 9 de fevereiro de 2010

AMAZÔNIA NÃO É O PULMÃO DO MUNDO

Texto redigido por Ney Gastal a partir de entrevista com José Lutzenberger
publicada no Jornal RS em janeiro de 1989


Chico Mendes morreu. Foi morto. E esta morte gerou um fato novo. Não foi o primeiro assassinato deste a ocorrer. Centenas, talvez milhares de pessoas já morreram em atentados semelhantes. Os próprios auxiliares do Chico, quase todos já foram mortos. Mas, pela primeira no mundo, o assassinato de uma pessoa tão humilde, vivendo em um lugar tão remoto, teve uma repercussão tão grande em nível internacional. Na europa e nos Estados Unidos a morte de Chico foi notícia até em jornais regionais, de pequenas aldeias. Mesmo na imprensa brasileira a repercussão foi maior do que o usual. Quando me telefonaram, uma hora depois da morte do chico, pensei no que fazer para que ela não fosse em vão, e tivesse a maior repercussão possível. Mas não foi necessário fazer nada. Desde o dia 23 de dezembro até hoje não houve um único dia em que a imprensa deixasse de mencionar o fato. O que demonstra a consciência que existe em todo o Planeta sobre a importância do que está acontecendo na Amazônia. Neste sentido a morte de Chico não terá sido em vão.

Pessoalmente, tive poucos contatos com ele. Nos encontramos em diversos congressos de meio ambiente, principalmente sobre Amazônia, e só nestes momentos pudemos conversar. Mas consegui, através de minha Fundação, uma verba para ajudá-lo. Chico era muito pobre e precisava passar longos períodos trabalhando na floresta, nos seringais, quando seria mais útil trabalhando pela desta floresta e dos seringais. Por isto, consegui uma verba mensal para ajudá-lo a sobreviver, sem precisar passar este tempo nos seringais. Agora estou gestionando junto a uma fundação americana para que ajude sua família, que ficou sem nada. Basta lembrar que a casa do Chico era um casebre de madeira, e que ele foi morto quando ia tomar banho, no banheiro que ficava fora do corpo da casa. Vejam como uma pessoa humilde pode se tornar importante na luta por uma causa mundial. Porque a luta pela preservação da Amazônia interessa a todo ser vivo deste Planeta.

Isto pode ser explicado em dois níveis, começando pelo biológico. As grandes florestas tropicais úmidas, na Amazônia, África, Indochina, Ìndia, Malásia, Filipinas, Indonésia, Nova Guiné e norte da Austrália são os ecossistemas mais complexos e ricos de vida de todo o Planeta. Ninguém sabe o número de espécies que existe ali. Cerca de 70% das espécies de vida da Terra vivem nestas florestas. Da maneira como são destruídas hoje, estamos apagando da face da terra milhares, senão milhões de espécies. Se amanhã desaparecesse a girafa, a zebra, o hipopótamo ou a baleia, isto seria manchete em todos os jornais do mundo. No entanto, cada vez que se derruba uma grande área da floresta amazônica, desaparecem dezenas, talvez centenas de espécies de animais e plantas menores. São insetos, aranhas, pequenos invertebrados, pássaros, répteis e mesmo pequenos mamíferos que desaparecem para sempre. Por que a floresta tem uma barbaridade de endemismos, ou seja, espécies endêmicas, que ocorrem somente em uma pequena região e em nenhum outro lugar do mundo. No momento em que o ecossistema desta região é destruído, aquela espécie também desaparece. Uma espécie que desaparece não volta jamais. Extinção é para sempre. Não só a Terra, mas o próprio Universo fica mais pobre. Então as pessoas que têm um mínimo de sentimento, um mínimo de sensibilidade, se preocupam com isto. Para estas pessoas, tais motivos são suficientes para que se preservem as florestas.

Infelizmente, são poucas as pessoas sensíveis a isto. Então tenho abandonado esta argumentação em favor de outra. Quem entende a importância deste processo biológico já está do nosso lado, e de nada adianta ficar pregando para convertidos. Precisamos de decisões, decisões imediatas, e estas só podem vir dos governantes, dos tecnocratas. Entre estes, infelizmente, idealistas são exceção, e o conhecimento científico, raro. Por isto precisamos de outro tipo de argumentaão, que sacuda com as suas convicções. Este é o argumento climático. È comum ouvirmos as pessoas dizerem que a Amazônia é o pulmão do mundo. Muitos tecnocratas usaram esta expressão para contra-argumentar que a Amazônia consome toda a quantidade de oxigênio que produz, logo não pode ser o pulmão do Planeta.

Existe aí um duplo equívoco. O pulmão consome, e não produz oxigênio, ao contrário do que pretendem os que utilizam esta imagem para dizer que a Amazônia é uma espécie de fábrica de oxigênio. Mas ela também está incorreta sob outro ponto de vista. Se a floresta, ou qualquer outro ecossistema, produzisse mais oxigênio do que consome, a concentração deste gás na atmosfera terrestre estaria em constante aumento. E isto não acontece. Pelo que sabemos, desde que houve a primeira transformação da atmosfera inicial, que era reduzinte, para uma atmosfera oxidante (dois e meio ou três bilhões de anos atrás), os níveis de oxigênio mudaram muito pouco.

A vida surgiu em uma atmosfera bem diferente da atual. Não havia oxigênio na atmosfera. Era uma atmosfera reduzinte, ou seja, que não oxidava as coisas. Naquele período ferro não se oxidava, ficava apenas preto. Hoje, ferro oxida, fica marrom, se degrada. Naquela atmosfera primordial predominavam gases como o metano, o gás carbônico e o amoníaco. Quando a vida produziu o fenômeno da fotossíntese, que tem como subproduto o oxigênio, este aos poucos foi oxidando o amonìaco, o gás carbônico, o metano, e deu origem a esta atmosfera que temos hoje, com uns 79% de nitrogênio, 20% de oxigênio e apenas um por cento de outros gases. Desde que a fotossíntese transformou aquela primeira atmosfera na segunda, as coisas têm se mantido estáveis durante cerca de dois e meio ou três bilhões de anos. Se não fosse assim, a vida teria acabado há muito tempo.

Se a concentração de oxigênio fosse mais baixa, os animais acabariam morrendo, porque precisam dele para viver. Se fosse mais alta, e em vez de 20% tivéssemos entre 25% e 30% de oxigênio na atmosfera, seria também o fim da Vida na superfície do Planeta. Uma concentração destas permitiria a uma árvore queimar em dia de chuva. O primeiro relâmpago acabaria com todos os ecossistemas. Veja, portanto, que a Vida neste Planeta é uma coisa bastante equilibrada, que mantém as condições propícias à sua própria existência.

Isto é a base do conceito Gaia.

As florestas tropicais úmidas, que antes da devastação das últimas décadas totalizavam algo em torno de nove milhões de quilômetros quadrados (mais da metade do continente americano), foram importantíssimas neste processo de manutenção das condições de vida do Planeta. Elas não foram o pulmão, como se dizia, e sim uma colossal bomba de calor. O que é "bomba de calor"? O refrigerador e o ar condicionado são bons exemplos. O primeiro tira o calor de seu interior e o dissipa do lado de fora. O ar condicionado pode tanto tirar calor da peça e jogá-lo para fora, quanto tirá-lo de fora e jogá-lo para dentro. A floresta tropical úmida é um colossal aparelho de ar condicionado, que regula a temperatura do Planeta. Há pouco tempo eu estava fazendo uma palestra no Canadá, quando um estudante perguntou como a floresta tropical úmida sobreviveu à Idade Glacial. A maioria das pessoas imagina que durante as Idades glaciais, que duraram milhares de anos cada uma (foram quatro), o Planeta inteiro ficou gelado. Nada disto! O gelo avançou na Europa, na Sibéria, na América do Norte, e um pouco aqui no sul da Argentina e da Austrália. Mas as temperaturas no Ecuador continuaram as mesmas. No auge dos períodos glaciais, quando o norte da Europa e o Canadá estavam cobertos por dois ou três quilômetros de gelo, as temperaturas nas regiões de Manaus ou Belém eram as mesmas de hoje. Os cinturões tropicais, estes sim, ficaram mais estreitos.

Imaginemos que no lugar da floresta tropical úmida houvesse um Saara. O deserto refletiria a maior parte da energia solar que ali incidisse de volta ara o espaço. Esta energia se perderia para o Planeta. Hoje, ao contrário, existe ali a floresta tropical úmida, que tem uma fantástica evapotranspiração. O que que dizer isto? É a soma da evaporação e da transpiração. O professor Salati, climatologista da Universidade de Piracicaba, que se aprofundou nesta questão, quando estava no INPA (Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia), em Manaus, fez um grande estudo sobre o ciclo da água das chuvas da região. Colhendo amostras e comparando isótopos de hidrogênio e oxigênio, ele podia determinar exatamente de onde vinham as amostras de água da chuva, se do oceano ou de diversos processos de reciclagem. Com estes estudos, ele demonstrou que, das chuvas que caem na Amazônia, cerca de 75% são devolvidas à atmosfera em menos de 48 horas e formam novas chuvas. 25% desta água nem chega até o chão: voltam ao mar, ainda evaporando parte no caminho. Os outros 50% são bombeados pela planta no subsolo para a copa, e devolvidos à atmosfera pela transpiração.

Vamos visualizar a floresta amazônica, com o Atlântico a leste e os Andes a oeste. Os ventos alíseos trazem as grandes massas de nuvens baixas, a cerca de 800 metros, e as primeiras nuvens ocorrem já no litoral. Salati demonstrou que esta chuva, quando chega à encosta dos Andes, já desceu e subiu cerca de seis ou sete vezes. Isto resulta numa gigantesca troca de energia, que é depois distribuída pelo Planeta inteiro. Ora, se ali tivéssemos um deserto, os ventos ascendentes originados do aquecimento do solo nu dissipariam as nuvens logo após a primeira chuva. A floresta, ao contrário, absorve a energia solar e a utiliza para evaporar e condensar água, fazendo uma fantástica reciclagem que vai da costa atlântica até os Andes. Segundo Salati, a energia envolvida neste processo, sobre quase cinco milhões de quilômetros quadrados de floresta, corresponde à energia de dezenas de milhares de bombas atômicas por dia! Isto é uma gigantesca máquina de transmissão de energia.

Hoje existem instrumentos fantásticos, que nos permitem ver o globo em sua totalidade. Se formos ao INPE (Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais), em São José dos Campos, ou até a NASA, nos Estados Unidos, podemos ver no monitor dos computadores a imagem do Planeta como um todo, com a Amazônia ao centro, e todo o deslocamento destas massas de nuvens. Nestes mesmos monitores vemos que, ao chegarem aos Andes, estas massas de ar se dividem em duas correntes. Uma vai para o Sul, atravessando toda a parte central do Brasil, chegando até aqui e entrando Patagônia adentro. Nosso clima no Sul depende muito da Amazônia. A outra corrente vai para o Norte. Toca a costa oriental dos Estados Unidos e entra até a Escandinávia e Europa Central.

Nestas imagens se vê quanto o clima da Europa, Sibéria e aqui da América do Sul depende em grande parte da Amazônia. Desde que temos esta visão global do Planeta, ficou bem clara a importância da Amazônia, e de todas as outras florestas equatoriais úmidas que ainda restam para a regulagem do clima mundial. Ao mesmo tempo que fica cada vez mais clara a fragilidade do processo todo.

Nestes últimos congressos sobre clima, em Toronto e Hamburgo, onde se reuniram centenas de climatólogos de todo o mundo, todos reconheceram que as irregularidades climáticas que estão afetando o Planeta inteiro nestes últimos dez ou quinze anos são as primeiras manifestações do efeito estufa, provocado pela civilização industrial. Mas, por outro lado, e foi isto que me chocou nestes congressos, estes cientistas continuam a fazer extrapolções lineares. Uma vez que o efeito estufa está aumentando, elevando a temperatura do Planeta, eles extrapolam a situação atual e afirmam que, nos próximos 40 ou 50 anos, a Terra vai ficar de quatro a cinco graus mais quente. Mas por que supor que o aumento será uniforme em todo o Ppaneta? Assisti em Hamburgo a uma conferência de um climatólogo britânico que falava sobre como a agricultura do mundo deve se adequar às mudanças climáticas que estão por vir. Em vez de se preocupar em mudar os métodos agrícolas para que eles não prejudiquem ainda mais o clima global, ele se preocupa apenas em adequar a agricultura a estas mudanças. E dizia até que elas não vão ser tão ruins, mostrando um mapa da Finlândia com dois riscos horizontais atravessando o país. Um, limitando a faixa até onde é possível plantar trigo hoje. Outro, 300 quilômetros mais ao norte, marcando até onde, segundo ele, será possível plantar este trigo quando o Planeta estiver mais quente. Não posso, de maneira alguma, aceitar este tipo de extrapolação linear. A natureza não se comporta assim, e temos bons exemplos disto.

Desde 1970 os climatólogos vêm advertindo sobre os riscos dos gases freón, dizendo que os mesmos estavam atacando a camada de ozônio. Calculavam o desgaste da mesma em 30% ou 40%, até o ano 2020. Só que previam uma diminuição gradual, lenta e uniforme sobre o Planeta inteiro. Na realidade o que aconteceu foi que se abriu um buraco na camada de ozônio em um lugar só, sobre a Antártida. Este tipo de efeito é totalmente imprevisível! Só se toma conhecimento dele quando acontece. Ninguém previu que se abriria um buraco na camada de ozônio, tanto que, quando ele foi detectado, os cientistas chegaram a pensar que se tratava de defeito na programação de seus computadores, e não de uma realidade concreta. Outro exemplo aconteceu na costa do Peru, uns dez anos atrás, liquidando com a indústria pesqueira do país. Aquela era uma das costas mais ricas em peixe do mundo. Nela batiam as águas frias da Corrente de Humbolt, que vem do Pólo Sul trazendo nutrientes minerais, que provocam a proliferação de plâncton que, por sua vez, resulta no aumento da população de peixes. De repente, uma corrente quente do Norte, e pobre em nutrientes, em vez de virar para oeste, como fazia sempre, seguiu para o sul e deslocou a Corrente de Humbolt uns 300 quilômetros para o sul. Ninguém sabe porque isto aconteceu, mas o fato é que os peixes sumiram, os pássaros que se slimentavam deles morreram, e a indústria pesqueira se foi. Tudo por conta de um fenômeno repentino e inesperado. Estas coisas são imprevisíveis, não acontecem lenta e previsivelmente, como querem os cálculos destes cientistas.

Vou dar um exemplo mais antigo. Na Sibéria e nos países escandinavos foram encontrados corpos inteiros, intactos, de mamutes congelados. O mamute era um parente próximo do elefante, duas vezes maior do que este, que vivia naquelas regiões. Como é que estes mamutes foram enterrados nestas enormes capas de gelo? Bichos daquele tamanho não comiam líquens como os que nascem em terrenos frios da Trunda. Precisavam de pelo menos meia tonelada de comida verde por dia. Como foram ficar congelados na neve? Só mesmo se tivessem sido surpreendidos por uma violenta e inesperada tempestade de neve que caiu sobre eles cobrindo-os, e ficando ali, na forma de gelo, por milhares e milhares de anos. Sabemos que as eras glaciais podem levar dezenas, ou até milhares de anos para acabar. Mas começaram de repente, de um dia para o outro, ou no curto espaço de alguns anos ou décadas. É isso que o pessoal não está se dando conta. Se olharmos de novo aquelas imagens de satélite, que mostram as correntes aéreas que saem da Amazônia e vão para o Sul e para o Norte, percebemos que, se elas desaparecerem, irá se iniciar uma nova Idade Glacial na Europa e talvez aqui, no Extremo Sul. Por isto não adianta dizer, como querem nossos governantes e principalmente nossos militares, que aquilo que fazemos na Amazônia não inteessa a ninguém, só a nós. Interessa, sim, e interessa a todo o mundo. A Amazônia não é só nossa. È do Planeta inteiro, um órgão vital do ser vivo chamado Gaia, que é a Terra. Não podemos continuar destruindo a Amazônia. É preciso parar. É preciso repensar conceitos. Mesmo porque, até sob um ponto de vista meramente econômico, aquilo é uma pilhagem. Os fazendeiros que estão lá ganham muito mais dinheiro com os subsídios do que com aquilo que plantam ou criam. Suas fazendas são 100% subsidiadas. O investimento feito é 100% dedutível do imposto e o sujeito ainda recebe dez anos de isenção fiscal total. Isto é corrupção, uma das causas desta inflação de 30% ao mês que estamos enfrentando. Mas se apenas os brasileiros pagam a conta da inflação, o mundo inteiro irá pagar pela destruição da floresta. Estamos destruindo a vida do Planeta para enriquecer meia dúzia de pessoas. O que está acontecendo na Amazônia é uma guerra. Uma guerra de pilhagem. Chico Mendes, como uma das pessoas que viviam integrads à floresta, lutou nesta guerra. Lutou contra a destruição. Foi um soldado da Vida. O mínimo que podemos fazer, em respeito à sua memória, é nos integrarmos todos à sua luta.

Disponível em http://www.fgaia.org.br/texts/t-amazonia.html acesso: 09/o2/2010

Amazônia não é o pulmão do mundo

Amazônia, pulmão do mundo sim ou não

Mas sua destruição poderia ter efeitos catastróficos no clima do planeta.
Aquecimento global e falta de chuvas estão ligados ao desmatamento.
Na capa de muitos jornais, sites, comunidades virtuais e blogs a Amazônia ainda é encarada como o grande “pulmão do mundo”. A idéia de que a floresta seria uma grande purificadora do ar, transformando gás carbônico em oxigênio, já foi desmentida por muitos cientistas, mas ainda sobrevive por aí. Apenas em dois textos do Blog da Amazônia, há 16 comentários que tratam a floresta dessa forma.

Apesar de haver muitas provas de que a Amazônia não exerce esse papel, é consenso entre os pesquisadores que as extensas áreas de floresta do Norte do Brasil têm grande influência no clima do planeta. Mesmo não sendo o tal pulmão, a Amazônia ainda seria um órgão vital.

Para Philip Fearnside, pesquisador do Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia (Inpa) e um dos cientistas mais respeitados no mundo quando se fala de aquecimento global, o erro já começa no
próprio apelido que se deu à Amazônia: “O pulmão não supre o oxigênio, ele tira.”

O pesquisador explica que a floresta está em equilíbrio. Todo o gás carbônico capturado por meio da fotossíntese é liberado novamente à atmosfera quando as plantas respiram e quando as árvores morrem e entram em decomposição.

Feranside ressalta, contudo, que o fato de a Amazônia não funcionar como o tal “pulmão do mundo” não significa que ela possa ser destruída. O desmatamento de milhões de quilômetros quadrados de floresta poderia desregular o regime de chuvas e acentuar o aquecimento global.

Círculo vicioso
A floresta está em equilíbrio apenas quando está em pé. Se ocorre uma queimada ou desmate, grandes quantidades de gás carbônico são liberadas na atmosfera, contribuindo para o efeito estufa. Hoje, o Brasil ocupa o quarto lugar entre os maiores emissores de gases que causam esse problema, sendo que cerca de três quartos dessa poluição provêm da destruição da mata.

De acordo com Fearnside, o desmatamento é um péssimo negócio para o Brasil. “Além de emitir muito mais carbono do que o combustível fóssil, ele também traz muito pouco benefício para a economia do país, gera muito pouco emprego”, avalia.

Com o aquecimento do planeta, a floresta corre o risco de entrar em um círculo vicioso de destruição e emissão de gases de efeito estufa, revela o cientista: “Na medida em que se começa a esquentar na Amazônia, morrem muitas as árvores. Com o aumento da temperatura, as árvores também precisam de mais água, e aí aumentam os problemas de incêndio. Além disso, esquenta-se o solo, que começa a liberar carbono. As grandes secas que houve na Amazônia, como a que aconteceu em 2005, tendem a aumentar.”

Falta de água

Ainda que o desmatamento e as queimadas não liberassem gases de efeito estufa, a transformação da floresta em pastos ou plantações poderia mudar radicalmente o regime de chuvas. Fearnside explica que grande parte das chuvas do Centro-sul do Brasil são causadas por ventos que trazem vapores da mata no Norte. “Se transformarmos a floresta em pastagens, as chuvas cairão lá [na Amazônia] e irão direto para o oceano. A água não será mais evaporada”, revela.
Além da falta de água potável – problema que já afeta periodicamente a cidade de São Paulo – a diminuição das chuvas também acarretaria na falta de energia. “[No Centro-sul] há muitas barragens, que geram energia para o Brasil. Essas hidrelétricas enchem em poucas semanas. Se falharem as chuvas nessas semanas críticas, as represas não enchem pelo resto do ano.”, alerta o pesquisador.


(Fonte : Iberê Thenório Do Globo Amazônia, em São Paulo)

Disponível em<http://www.plurall.com/forum/cultura-trance/ecologia/21134-amazonia-nao-mais-o-pulmao-do-mundo/ > acesso em 04/02/2010

Amazonia Pulmão do Mundo, Sim ou Não?

Para os ecólogos, um ecossistema no estágio de clímax, como a Floresta Amazônica, é estável no que se refere à produção e ao consumo de alimento. Em outras palavras, tudo o que o ecossistema produz é consumido por ele mesmo. A fotossíntese global e a respiração total do ecossistema estão em equilíbrio; o gás carbônico produzido na respiração é consumido na fotossíntese, enquanto que o oxigênio que a fotossíntese libera é consumido pela respiração de todos os organismos da Floresta. Essa idéia, obviamente, contradiz a noção antiga de que a Floresta Amazônica seria o "pulmão do mundo", no sentido de ser um importante fornecedor de oxigênio para a atmosfera de nosso planeta.
A idéia hoje aceita de que a Floresta não é o pulmão do mundo sofreu alguma contestação ultimamente. Foi realizado um interessante trabalho por um grupo de 11 pesquisadores, entre os quais três brasileiros, Carlos Nobre, do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (INPE), Antônio C. Miranda e Heloísa S. Miranda, da Universidade de Brasília. Acredita, esse grupo, que o aumento da taxa de gás carbônico atmosférico que vem se verificando nos últimos anos poderia estar, na realidade, incrementando a taxa de fotossíntese na Floresta Amazônica, o que resultaria em aumento da biomassa. Os pesquisadores trabalharam numa região de floresta tropical virgem, situada na Reserva Biológica do Jaru, em Rondônia. Fizeram medidas precisas do fluxo de gás carbônico, de vapor de água e de calor, tanto num período seco (em setembro de 1992) como num período chuvoso (de abril a junho de 1993). Essas medidas foram feitas em uma torre, 15 metros acima das copas das árvores, abrangendo a medição uma área aproximada de 1 km2.
Os resultados obtidos mostraram claramente que o ecossistema, no período estudado, absorveu mais gás carbônico (portanto, fez mais fotossíntese) do que produziu (por respiração e decomposição). Dos 44 dias de medição durante a estação chuvosa, 33 apresentaram fluxo de CO2 da atmosfera para a floresta; os outros 11, em que o sistema perdeu carbono, coincidiram com dias frios, nublados e com ventos. Cálculos feitos pelo grupo estimam que, pelo menos na região estudada, a taxa de absorção de carbono equivaleria à produção anual de duas toneladas de biomassa por hectare. Extrapolando os resultados para toda a Amazônia, calcula-se que um acúmulo de mais ou menos duas toneladas por ano e por hectare deveria dobrar a biomassa da Floresta a cada cem anos!
Na realidade, os próprios autores reconhecem que as condições existentes na área de 1 km2 de Floresta estudada não serão necessariamente idênticas às da bacia amazônica inteira, que ocupa uma área total de cerca de 5 milhões de km2, e concordam que a extrapolação é pelo menos muito arriscada. Haveria a necessidade de pesquisar vários outros pontos da Floresta, eventualmente durante um período mais longo, para se ter uma idéia mais precisa de como ela, como um todo, reage ao aumento da taxa de CO2 no ar. De qualquer maneira, o que podemos dizer sem medo de errar é que, pelo menos em algumas regiões da Floresta Amazônica, a produção de biomassa é maior do que seu consumo; isso implica, evidentemente, retirada de gás carbônico do ar e produção de oxigênio, o que talvez justificaria, parcialmente, o nome de "pulmão do mundo".
Texto adaptado pelos professores César, Sezar e Bedaque
de um artigo da seção ECHO-BRAZIL,
da revista Ciência Hoje, de 1996.
Disponível emhttp://www.editorasaraiva.com.br/eddid/CIENCIAS/biblioteca/artigos/amazonia.html acesso: 04/fev/2010

segunda-feira, 8 de fevereiro de 2010

A Amazônia como comunidade Clímax: Pulmão do mundo?

Em novembro de 1971, o biólogo alemão Harald Sioli, do Instituto Max Planck, voltava da Amazônia, onde estivera pesquisando os ciclos de nutrientes na floresta. Entrevistado por um jornalista, Sioli afirmava que a floresta continha grande porcentagem de gás carbônico (CO2), o qeu muito surpreendia. Posteriormente, ao transcrever a declaração, o jornalista esqueceu-se da letra C – símbolo do átomo de carbono – da fórmula citada pelo biólogo que passou para o texto como sendo O2 (oxigênio).
A reportagem, com o oxigênio no lugar de gás carbônico, foi publicada pelo mundo afora e assim, da noite para o dia, e graças a um erro jornalístico, a Amazônia passou a ser conhecida como “pulmão do mundo” – expressão de grande impacto emocional.
Estava criado assim um dos mais persistentes mitos sobre a Floresta Amazônica, que tem semeado confusão nos apaixonados debates sobre a preservação da das florestas tropicais, apontadas, desde então, como a garantia de suprimento de oxigênio para a nossa respiração.
A realidade, no entanto, não é bem assim. Amazônia, por ser constituída por florestas tropicais, uma comunidade clímax, mantém-se num equilíbrio dinâmico. Assim, o oxigênio produzido durante o dia é todo consumido na respiração pelos vegetais e animais. Isso ocorre porque além de ter enorme biomassa animal que respira e consome consideráveis quantidades de oxigênio, a vegetação é complexa e formada por espécies de grande porte (árvores com mais de 30m de altura). O crescimento e manutenção de corpos de grande biomassa exige dos vegetais muito mais gasto de energia, que é obtida pela respiração. Desse modo o que sobra de oxigênio, no balanço entre gasto e o produzido, é uma quantidade muito pequena e desprezível, em relação ao tamanho da Amazônia.
Estudos sobre a produção e circulação de oxigênio indicam que a quantidade desse gás, produzido pela vegetação terrestre, é apenas 10% do proveniente dos oceanos. O verdadeiro “pulmão do mundo” está no mar, e os responsáveis pela produção de oxigênio são as algas, unicelulares em sua maioria. Como têm corpo de pequenas dimensões, seus gastos energéticos – e consequentemente o seu consumo de oxigênio – é muito menor que o produzido pela fotossíntese. As algas, na maior parte dos casos, não formam uma comunidade clímax, mas estão sempre em processo de sucessão. Além disso, os oceanos cobrem uma superfície muito maior que todas as florestas (tropicais e temperadas) do mundo; e as algas encontram-se desde a superfície até 300 m de profundidade (na faixa equatorial), espessura maior que os 40 a 50m de vegetação que existem na Floresta Amazônica.
A Amazônia não só não é o “pulmão do mundo como também não é o filtro de poluição. É certo que se a concentração de gás carbônico aumentasse na atmosfera, as florestas absorveriam maior quantidade dele para transformá-lo em massa corporal. Mas isso aconteceria dentro de certos limites, pois estando as populações em equilíbrio, o número de novas árvores que surgem (que consomem o gás carbônico) equivale ás mortas ( que o liberam em sua decomposição).
Pior, a Amazônia não só não limpa a atmosfera, como a polui um pouco. Estudos realizados na floresta, durante o anos 80, indicaram que a decomposição de grandes quantidades de matéria orgânica, existentes em seu chão, libera monóxido de carbono e metano (gases consideráveis poluentes) em concentrações que não chegam a ser tóxicas para os animais. Na verdade, quem também exerce o papel de filtro de poluição são os oceanos, porque absorvem grandes quantidades de gás carbônico e de outros poluentes, dissolvidos na chuva das tormentas tropicais.
Evidentemente, a realidade dos fatos não justifica, de maneira alguma, a destruição da Floresta Amazônica, cujo papel é fundamental, entre outros fatores para a manutenção do clima, do seu solo e da grande riqueza de espécies, fonte de recursos genéticos e biológicos. Mas, por outro lado, essa mesma realidade revela que também, os oceanos devem ser objeto de cuidados e desvelos pela sua preservação, por serem os verdadeiros “pulmões do mundo”. Daí não serem mais considerados como depósito final e infinito de todo o lixo e poluição gerados no planeta.

Fonte:
SARIEGO, José Carlos. Educação Ambiental – As ameaças ao planeta azul. Ed. Scipione. SP, p. 77 – 78, 1994.